ARSÈNE LUPIN, O LADRÃO DE CASACA

O ladrão de casaca: As primeiras aventuras de Arsène Lupin em primorosa edição de capa dura de 2016 da Editora Zahar (coleção Clássicos Zahar), com tradução de André Telles e Rodrigo Lacerda

Desde que aprendi a ler e escrever tornei-me um leitor serial (como vocês podem conferir em minha crônica O Melhor Amigo do Homem que pode ser lida aqui. Meu primeiro livro foi Fábulas, de Monteiro Lobato, que minha mãe “deixou” sobre a minha cama. Na pré-adolescência e adolescência li e reli toda a obra infanto-juvenil do escritor genial de Taubaté que, se tivesse escrito em inglês ou alemão ou francês seria hoje mundialmente conhecido, com seus livros transformados em desenhos da Disney ou Dreamworks, imagino. 

Nos anos 1967 a 69 eu e meu amigo Ricardo Weiss fomos acometidos por uma paixão pelas histórias rocambolescas de Arsène Lupin de autoria do francês Maurice Leblanc. A obra havia sido publicada aqui no Brasil pela Editora Vecchi nos anos cinquenta com capas sugestivas e gritantes do desenhista dinamarquês Nils (algumas das quais você pode ver nesta postagem), de modo que naquela época já não estava mais nas livrarias, mas podia ser encontrada nas estantes das bibliotecas públicas. Viramos sócios das bibliotecas da Zona Sul — Copacabana, Gávea, Botafogo — onde garimpávamos a obra de Leblanc. Nos anos oitenta alguns dos livros da coleção foram retraduzidos e editados pela Nova Fronteira. E na segunda década do século XXI, com o seriado da Net, Lupin vem sendo redescoberto pelas novas gerações.

Alguns anos atrás descobri a leitura digital. Com ela você maximiza suas possibilidades de leitura, aproveitando momentos normalmente ociosos como uma fila que não anda, uma viagem torturante de avião, ou um percurso de metrô ou ônibus, etc. para curtir o maior prazer da vida, que não é sexo nem comida, e sim a leitura. Pois tive a sorte de deparar com a obra completa do Maurice Leblanc sobre Arsène Lupin em ebook no original francês (foto abaixo) a um preço de banana, e enveredei pelo projeto de relê-la (agora no idioma original, que eu não dominava tão bem nos anos sessenta), como que me transpondo à adolescência e tentando reviver as velhas emoções. (Nota: Conheça meu dicionário eletrônico gratuito francês-português, resultante de minha leitura de literatura francesa,  clicando aqui.)


Mas quem "foi" Arsène Lupin? O primeiro livro da coleção o define como "gentlemen-cambrioleur", um gatuno cavalheiro, ou "ladrão de casaca", tradução que se consagrou. Mas é um gatuno "com princípios": só rouba dos miliardários e não comete assassinatos (ao menos não voluntariamente). Mas é mais do que isto: aventureiro, descobridor de tesouros fabulosos, decifrador de enigmas cabulosos, imperador de um reino que conquistou no norte africano e oferece à França, detetive (que desmascara o criminoso mas se apropria do produto do roubo), mente privilegiada que deixa Sherlock Holmes no chinelo (como você verá em Arsène Lupin contra Herlock Sholmes). Segundo o Résumé des romans, nouvelles et pièces de théâtre de Maurice Leblanc (link no final desta postagem), um "Robin Hood da Belle Epoque", mas "um Robin Hood bem francês: ele não se leva muito a sério, suas armas mais mortíferas são seus dotes intelectuais, não é um aristocrata que vive como um anarquista mas um anarquista que vive como um aristocrata." Segundo o juiz de instrução M. Rousselain, personagem de A Vingança da Cagliostro, "ele arriscará a vida pela salvação dos outros, e não resistirá eventualmente a lhes surrupiar o porta-níqueis."

Um fã insuspeito de Arsène Lupin foi o colunista social Zózimo Barroso do Amaral, ao menos na juventude, conforme lemos na página 79 de sua biografia por Joaquim Ferreira dos Santos: "Nos cantos, coleções de gibis do Tarzan e romances policiais do francês Maurice Leblanc, com as aventuras de Arsène Lupin, o ladrão de casaca." Também Pedro Nava, na juventude, leu muito "Sherlock Holmes, Nick Carter, Arsène Lupin, Pardaillan e Maigret", como narra no último capítulo do último volume (O círio Perfeito) de suas memórias.

A seguir a lista das obras em ordem cronológica de publicação em francês e em seguida seus resumos. A relação inclui romances e contos isolados, mas não as peças de teatro. Se você também foi ou é fã de Lupin, deixe uma mensagem na seção de comentários ao final da postagem.

LISTA DAS OBRAS EM ORDEM CRONOLÓGICA DE PUBLICAÇÃO:

1. Arsène Lupin gentleman cambrioleur (Arsène Lupin, Ladrão de Casaca - 1907)

2. Arsène Lupin contre Herlock Sholmès (Arsène Lupin contra Herlock Sholmes - 1908)

3. L'Aiguille creuse (A Agulha Oca - 1909)

4. 813 (publicado pela Vecchi em dois volumes, 813 e Os Três Crimes de Arsène Lupin; reeditado pela Nova Fronteira como 813 - 1910)

5. Le Bouchon de cristal (A Rolha de Cristal - 1912)

6. Les Confidences d'Arsène Lupin (As Confidências de Arsène Lupin - 1913)

7. L'Éclat d'obus (O Estilhaço de Obus na edição Vecchi; O Estilhaço de Granada na edição Nova Fronteira - 1915)

8. Le Triangle d'or (publicado pela Vecchi em dois volumes: O Triângulo de Ouro e A Câmara da Morte - 1917)


9. L'Île aux trente cercueils (publicado pela Vecchi em dois volumes: A Ilha dos Trinta Ataúdes e O Flagelo de Deus - 1919)


10. Les Dents du tigre (publicado pela Vecchi em dois volumes: Os Dentes do Tigre e O Segredo de Florence - 1920)


11. Les Huit Coups de l'horloge (As Oito Pancadas do Relógio - 1923)


12. La Comtesse de Cagliostro (A Condessa de Cagliostro - 1924)


13. La Demoiselle aux yeux verts (A Moça dos Olhos Verdes - 1927)


14. L'Homme à la peau de bique (1927)


15. L'Agence Barnett et Cie (A Agência Barnett & Cia. - 1928)


16. La Demeure mystérieuse (A mansão misteriosa - 1928)


17. La Barre-y-va (O Mistério do Rio do Ouro - 1930)


18. Le Cabochon d'émeraude (1930)


19. La Femme aux deux sourires (A Mulher de Dois Sorrisos - 1932)


20. Victor, de la Brigade mondaine (Arsène Lupin, na Pele da Polícia - 1934)


21. La Cagliostro se venge (A Vingança da Cagliostro - 1935)


22. Les Milliards d'Arsène Lupin (1939)


23. Le Dernier Amour d'Arsène Lupin (2012)


RESUMO DAS OBRAS:

1. Arsène Lupin gentleman cambrioleur (Arsène Lupin, Ladrão de Casaca - 1907), coletânea de 9 contos


A coletânea agrupa as seguintes histórias:

  • A prisão de Arsène Lupin, publicação original em Je sais tout, n° 6, 15 de julho de 1905. Ao desembarcar nos EUA de uma viagem no transatlântico Provence, o “ladrão de casaca” Arsène Lupin — “o incansável ladrão cujas proezas enchiam as páginas dos jornais havia meses [...] o caprichoso gentil-homem que só operava nos castelos e nos salões [...] o homem dos mil disfarces” — é preso por seu arqui-inimigo, o inspetor Ganimard. Mas graças ao seu poder de sedução, consegue se desvencilhar, antes, das “provas do crime”, dinheiro e joias furtados durante a travessia marítima.
  • Arsène Lupin na prisão, publicação original em Je sais tout, n° 11, 15 de dezembro de 1905, sob o título La Vie extraordinaire d'Arsène Lupin en prison. Mesmo trancafiado atrás das grades, Arsène Lupin, através de um estratagema, consegue surrupiar obras de arte valiosas (dois Rubens, um Watteau etc.) do castelo "inexpugnável" do Barão Cahorn.
  • A evasão de Arsène Lupin, publicação original em Je sais tout, n° 12, 15 de janeiro de 1906, sob o título La Vie extraordinaire d'Arsène Lupin: L'Évasion d'Arsène Lupin. Arsène Lupin cria uma expectativa de que fugirá da prisão e, fazendo-se passar por outra pessoa (o pobre-coitado Baudru Désiré), acaba conseguindo sair de lá.
  • O viajante misterioso, publicação original em Je sais tout, n° 13, 15 de fevereiro de 1906, sob o título La Vie extraordinaire d'Arsène Lupin: Le Mystérieux Voyageur. Em viagem de Paris a Rouen, Arsène Lupin (sob o pseudônimo Guillaume Berlat) sofre uma agressão e assalto, mas depois ajuda a polícia (embora a rigor ele próprio seja procurado pela polícia!) a prender o ladrão: o assassino Pierre Onfrey.
  • O colar da rainha, publicação original em Je sais tout, n° 15, 15 de abril de 1906, sob o título La Vie extraordinaire d'Arsène Lupin: Le Collier de la reine. Numa noite após uma recepção, o lendário “colar da rainha” (que pertenceu a Maria Antonieta) desaparece misteriosamente da mansão do conde e condessa de Dreux-Soubise. Anos depois, em almoço em casa do casal, um tal de cavalheiro Floriani, que o conde conhecera na Sicília (mas que na verdade é Arsène Lupin sob um de seus muitos disfarces) elucida o mistério. [O ladrão foi ele próprio, aos seis anos, para ajudar a mãe Henriette, parente do casal e que trabalhava de camareira da condessa.]
  • O cofre-forte da Sra. Imbert, publicação original em Je sais tout, n° 16, 15 de maio de 1906, sob o título La Vie extraordinaire d'Arsène Lupin: Le Coffre-fort de madame Imbert. Primeiro golpe da "carreira" de Arsène Lupin, verdadeiro "batismo de fogo", e a primeira vez que ele usa este nome. De olho na suposta fortuna do casal Imbert, Lupin trama um ataque noturno contra o Sr. Ludovic e finge salvá-lo. Este, agradecido, contrata Lupin como seu secretário particular, que se aproveita da situação para assaltar o cofre-forte. Só que os títulos lá guardados eram falsos! "Foi a única vez, durante toda a minha vida, que fui logrado. Mas, com todos os demônios, essa vez valeu por muitas e boas!"
  • Herlock Sholmes chega tarde, publicação original em Je sais tout, n° 17, 15 de junho de 1906, sob o título La Vie extraordinaire d'Arsène Lupin: Sherlock Holmes arrive trop tard. Observe-se que, entre a publicação no periódico e a publicação na coletânea, Sherlock Holmes tornou-se Herlock Sholmès, em virtude de um protesto de Conan Doyle, "pai do verdadeiro Sherlock Holmes". Primeiro encontro entre o "ladrão nacional" francês Arsène Lupin e o "grande policial inglês [...] Herlock Sholmes, o mais extraordinário decifrador de enigmas", girando em torno de uma passagem secreta, cujo segredo se perdeu com o tempo, que dá acesso ao castelo de Thibermesnil, cujos tesouros são cobiçados por Lupin (aqui sob o pseudônimo de Horace Velmont).
  • A pérola negra, publicação original em Je sais tout, n° 18, 15 de julho de 1906, sob o título La Vie extraordinaire d'Arsène Lupin: La Perle noire. Arsène Lupin penetra no apartamento da viúva Zalti, condessa de Andillot, com o intuito de roubar a pérola negra, presente de um imperador. Depara com seu corpo, assassinada, e constata que a pérola desapareceu. Tempos depois Lupin extorque a pérola do ladrão e assassino, que havia sido absolvido pela Justiça, por falta de provas, provas essas que o próprio Lupin, maquiavelicamente, havia removido.
  • O sete de copas, publicação original em Je sais tout, n° 28, 15 de maio de 1907, sob o título Comment j'ai connu Arsène Lupin: Le Sept de cœur. Fatos estranhos e inexplicáveis ocorrem na casa do narrador (Maurice Leblanc), a qual, à sua revelia, servia de esconderijo para os planos roubados do submarino Sete de Copas. As investigações o levam a descobrir que seu amigo Jean Daspry na verdade é Arsène Lupin, de quem se torna biógrafo. "E eis como conheci Arsène Lupin. [...] Eis como estabeleci laços de amizade muito agradáveis com o nosso grande homem e como, pouco a pouco, graças à confiança com que ele se digna honrar-me, me tornei seu mui humilde, mui fiel e mui reconhecido historiógrafo."


NOTA: Títulos em português e citações do texto da tradução de João Távora para a Editora Vecchi nos anos 50. As histórias estão aqui em ordem cronológica da publicação original. No livro (de 1907), após as cinco primeiras histórias, a ordem é: "O sete de copas", "O cofre-forte da Sra. Imbert", "A pérola negra" e "Herlock Sholmes chega tarde", fechando o volume e preparando o leitor para o livro seguinte, Arsène Lupin contra Herlock Sholmes (1908).

    2. Arsène Lupin contre Herlock Sholmès (Arsène Lupin contra Herlock Sholmes - 1908), coletânea compreendendo dois episódios: "A Dama Loura" e "A Lâmpada Judaica"




    Arsène Lupin contra Herlock Sholmes é uma coletânea de duas histórias escritas por Maurice Leblanc, sobre as aventuras opondo Arsène Lupin a Herlock Sholmes.

    A coletânea contém duas narrativas:

    1) La Dame blonde (A Dama Loura), publicada em Je sais tout de 15 de novembro de 1906 até 15 de abril de 1907. Divide-se em seis capítulos. Dois acontecimentos envolvendo uma dama loura e desaparecimentos misteriosos — o bilhete premiado do Sr. Gerbois e o diamante azul da condessa de Crozon — fazem com que chamem o célebre detetive inglês Herlock Sholmes, único capaz de enfrentar Lupin. Num brilhante trabalho investigativo, Sholmes descobre o segredo das quinze casas projetadas pelo arquiteto Destangue e "retocadas", com "tubos acústicos, passagens secretas, tábuas de assoalho que deslizam, escadas escondidas", por Lupin para lhe servirem de esconderijo e para outros fins criminosos. Só que, nesse meio-tempo, Lupin lhe prega uma série de peças.

    2) La Lampe juive (A Lâmpada Judaica), publicada em Je sais tout de 15 de julho a 15 de agosto de 1907. Divide-se em dois capítulos. O Barão Imblevalle, a quem roubaram uma lâmpada contendo uma joia preciosa, chama Herlock Sholmes para encontrá-la. Lupin envia uma carta ao detetive pedindo que não intervenha. Sholmes a ignora e vai para Paris com Wilson. Finalmente consegue encontrar a lâmpada judaica, mas descobre que sua investigação teve o efeito oposto ao pretendido. Na verdade perturbou os planos de Lupin que pretendia ajudar a família do Barão. Primeira menção na obra sobre Lupin do lado "bom" do "ladrão de casaca". "— Então, você faz o bem também? [pergunta Sholmes] — Quando tenho tempo. Isso me diverte. Acho graça que, na aventura que nos ocupou, eu tenha sido o gênio bom que socorre e salva, e você o mau que traz o desespero e as lágrimas. [responde Lupin]"

      3. L'Aiguille creuse (A Agulha Oca - 1909), romance


      Como os dois volumes anteriores das histórias de Arsène Lupin, foi inicialmente publicado em forma de folhetim na revista Je sais tout, de 15 de novembro de 1908 a 15 de maio de 1909.

      O volume foi lançado em junho de 1909 com algumas modificações.

      Arsène Lupin opõe-se dessa vez a Isidore Beautrelet, jovem estudante de retórica e detetive amador, que lhe dará muito trabalho. A Agulha Oca é o segundo segredo da rainha Maria Antonieta e Cagliostro, transmitido pelos reis de França e agora conhecido por Arsène Lupin. A famosa agulha contém os mais fabulosos tesouros jamais imaginados, reunindo os dotes das rainhas ("Todas as pedras preciosas cintilavam, todas as cores resplandeciam, o azul das safiras, o fogo dos rubis, o verde das esmeraldas, o sol dos topázios"), além das peças roubadas pelo próprio Lupin, entre elas a Mona Lisa original.

      Quando Isidore Beautrelet descobre o Castelo da Agulha no departamento de Creuse, julga ter descoberto a solução do enigma ("creuze" em francês significa "oco"). Mas ele ignorava que o rei Luís XIV mandara construir o castelo para desviar os curiosos da verdadeira agulha oca, na Normandia, perto da cidade de Le Havre, onde Arsène Lupin se escondera. 

      Depois de muito refletir, Beautrelet percebe que todos os eventos em torno da Agulha Oca ocorreram na Normandia, no triângulo de Caux, limitado por Rouen, Dieppe e Le Havre. Parte para lá a fim de averiguar e enfim descobre a Agulha de Etretat, oca. Decifra o código enigmático que contém o segredo do acesso à Agulha Oca e pede ajuda a Ganimard para prenderem Lupin e se apoderarem do esconderijo e tesouro. A certa altura, Ganimard guarda a saída enquanto Beautrelet avança até o núcleo da Agulha. Lá, para seu espanto, aguardam-no para uma refeição Lupin e senhora. Este mostra todos os tesouros acumulados na Agulha Oca — entre eles, “a Gioconda de Leonardo da Vinci, a verdadeira” — que lega à França com a condição de que sejam instalados no Museu do Louvre na Sala Arsène Lupin. 

      Lupin foge num submarino (cujo projeto foi tema da história "O Rei de Copas" de Arsène Lupin, Ladrão de Casacacom Mlle Raymonde, com quem se casou, para o Porto Lupin, local protegido onde pretende abandonar a vida de ladrão de casaca e viver com sua esposa como um “lavrador de casaca”. Mas o arqui-inimigo Herlock Sholmes o espera e, no entrevero, mata a mulher de Lupin.

      4. 813 (1910) — romance editado pela Vecchi nos anos 50 em dois volumes: 813 e Os Três Crimes de Arsène Lupin, reeditado em 1976 pela Nova Fronteira como 813



      Uma das histórias mais dramáticas de Arsène Lupin, cheia de reviravoltas e revelações (uma delas envolvendo a infiltração de Lupin nas forças policiais), com um assassino cruel à solta, cuja identidade, como numa história de Agatha Christie, é imprevisível. Vítima de terríveis golpes do destino, o normalmente afável e charmoso Lupin se vê culpado por três mortes. A história gira em torno de um antigo grão-ducado cuja restauração desperta a ambição de Lupin (que o negocia com o Kaiser alemão em troca de documentos secretos), bem como a de seu inimigo misterioso e sanguinário. Ao final Lupin, movido pelo sentimento de culpa, simula sua morte e vai parar na Legião Estrangeira, no Marrocos.



      ENREDO:
      O multimilionário Rudolf Kesselbach é assassinado em Paris. O adversário de Arsène Lupin durante todo esse caso é o misterioso "L.M.", um assassino, que força o ladrão de casaca a abandonar sua identidade de Monsieur Lenormand. Lupin tenta se esconder da polícia, mas acaba se deixando prender.

      Sabendo que o imperador alemão recorreu a Herlock Sholmès para resolver o mistério de "813", sem sucesso, Lupin "convoca" o Kaiser na prisão. Este faz com que libertem Lupin, que pode assim se dedicar a resolver o enigma. Mas mesmo com a prisão do bando, a ameaça de "L.M." persiste.

      De volta à França, Lupin espera casar sua filha, Geneviève, com o herdeiro do ducado Deux-Ponts-Veldenz (na realidade Gérard Baupré que ele preparou para este papel). Entretanto, este se apaixona por Dolorès Kesselbach, por quem Lupin já se interessara. As tragédias se precipitam, levando à morte de Dolorès e de Baupré. Rechaçado por Victoire, derrotado, Arsène simula sua morte e desaparece. "Triunfei de todo: e fui vencido. Chego ao fim que persigo e caio. O destino é mais forte do que eu... E aquela que eu amava não existe mais. Morro também."

      Após haver reencontrado o imperador alemão na Itália, Lupin, deprimido, tenta se matar se lançando do alto de um penhasco. Ele sobrevive à queda no Mediterrâneo e se engaja na Legião Estrangeira sob a identidade de don Luis Perenna.

      5. Le Bouchon de cristal (A Rolha de Cristal - 1912), romance



      Lupin enfrenta Daubrecq, parlamentar francês e chantagista inescrupuloso que quer utilizar uma lista de 27 personalidades implicadas num escândalo financeiro para semear a ruína e caos no país. O documento comprometedor está dissimulado numa rolha de cristal.

      6. Les Confidences d'Arsène Lupin (As Confidências de Arsène Lupin - 1913), coletânea de 9 contos



      • O Jogo dos Raios de Sol, publicação original em Je sais tout n° 75, 15 de abril de 1911. Uma mensagem em código projetada por raios de sol na fachada de uma casa (cujos erros ortográficos compõem a palavra ETNA) leva Lupin a decifrar o mistério do desaparecimento da esposa do barão Repstein, que fugiu levando toda sua fortuna. Lupin acaba encontrando o corpo da baronesa no cofre-forte do barão.
      • A Aliança de Casamento, publicação original em Je sais tout n° 76, 15 de maio de 1911. Um anel onde Yvonne d’Origny gravou o nome de um antigo admirador poderá servir de ensejo ao seu marido para obter o divórcio e a guarda do filho. Este antigo admirador na verdade foi Lupin, sob o pseudônimo de Horace Velmont, que agora se faz passar pelo joalheiro para salvá-la do vexame.
      • O Signo da Sombra, publicação original em Je sais tout n° 77, 15 de junho de 1911. Ao seguir uma mulher (Louise d'Ernemont) que por coincidência possui um quadro idêntico ao de seu biógrafo (o narrador deste episódio), Lupin (sob o pseudônimo de capitão Janniot) acaba descobrindo valiosos diamantes escondidos por uma vítima do Terror.
      • A Armadilha Infernal, publicação original em Je sais tout n° 78, 15 de julho de 1911. A viúva Dugrival, cujo marido se matou após ter uma fortuna roubada por Lupin no hipódromo, jura vingança. Ela atrai o ladrão de casaca a uma armadilha infernal, inescapável. Mas o "poder de sedução" de Lupin o salva.
      • A Echarpe de Seda Vermelha, publicação original em Je sais tout n° 79, 15 de agosto de 1911. Ganimard cai numa armadilha armada por Lupin e, valendo-se de informações por este repassadas, desvenda um assassinato, mas a joia que o assassino tentava roubar vai parar nas mãos de Lupin.
      • A Morte Que Espreita, publicação original em Je sais tout n° 80, 15 de setembro de 1911. A partir de uma carta que Jeanne Darcieux escreveu mas depois rasgou e jogou fora, Lupin (sob o pseudônimo de Paul Daubreuil) descobre que alguém procura assassiná-la e desmascara o criminoso (que parecia acima de qualquer suspeita), salvando-a.
      • O Casamento de Arsène Lupin, publicação original em Je sais tout n° 94, 15 de novembro de 1912. Fazendo-se passar pelo sobrinho do Duque de Sarzeau-Vendôme, que mantém aprisionado num barco, Lupin consegue desposar sua romântica filha, Angélique, detentora de uma fortuna.
      • O Canudinho de Palha, publicação original em Je sais tout n° 96, 15 de janeiro de 1913. Lupin descobre o ladrão que se escondeu na fazenda do Patrão Goussot (disfarçado de espantalho) após roubar seu dinheiro, mas embolsa o produto do roubo.
      • Edith, Pescoço de Cisne, publicação original em Je sais tout n° 97, 15 de fevereiro de 1913. Partindo do pressuposto de que "com Lupin não há mortes", Ganimard desvenda o roubo misterioso da coleção de tapeçarias do supostamente brasileiro Coronel Sparmiento. Afinal, "não devemos, quando se trata [de Arsène Lupin], esperar exatamente o que é inverossímil e estupeficador?"

        7. L'Éclat d'obus (O Estilhaço de Obus na edição Vecchi; O Estilhaço de Granada na edição Nova Fronteira - 1915), romance






        Este livro é mais uma história de guerra (Primeira Guerra Mundial) e espionagem do que uma aventura típica de Lupin. Tanto é que na versão original em folhetim e na primeira edição, Lupin sequer figurava, tendo sido introduzido, em rápida aparição num hospital de campanha, pouco depois. Quando criança, Paul Delorze viu, junto com seu pai, brevemente o Kaiser alemão Guilherme II numa capela em território francês e, ato contínuo, o pai foi assassinado por uma acompanhante do Kaiser. Anos depois, Paul casa-se com Elizabeth e vai morar na propriedade que o pai dela, conde d’Anderville, abandonara depois da morte da esposa, com a filha ainda pequena. Lá chegando, ao ver o retrato da mãe de Elizabeth pendurado na parede, Paul constata, surpreso, que foi a mesma mulher que matou seu pai. Paul parte para a guerra, onde um tal major Hermann o persegue, e chega a ver uma camponesa com a fisionomia da assassina do seu pai. Os alemães ocupam por um período a propriedade de Andeville, matam os caseiros, e Elizabeth desaparece. A análise de um estilhaço de projétil (obus, no original, que a edição da Vecchi traduziu por obus e a da Nova Fronteira, por granada; na verdade, trata-se de um projétil lançado por uma peça de artilharia, não de uma granada de mão. Aliás, a tradução da Nova Fronteira tem outras falhas além desta) revela que não foi morta, e sim sequestrada.


        Com ajuda de Arsene Lupin, que o visita brevemente no hospital, Paul descobre um túnel que liga as imediações da propriedade a território alemão. Pelo túnel Paul penetra no lado inimigo onde tenta libertar Elizabeth, que está aprisionada. Sequestra o filho do Kaiser e em troca pede a libertação da esposa e de prisioneiros de guerra franceses. Desvenda os crimes da Condessa Hermine, membra da família imperial Hohenzollern, que herdou do pai “um ódio feroz, selvagem, contra essa França” e conduziu uma obra gigantesca de preparação e espionagem, da qual fez parte o túnel de Ebrecourt a Corvigny, para facilitar uma invasão da França. A condessa, que se fazia passar pelo major Hermann e até pela mãe de Elizabeth (caso do retrato), é fuzilada. O livro termina com uma mensagem antibélica: "Ao lado, uma criança levantou os braços para eles, pobres braços onde já não havia mãos."

        8. Le Triangle d'or (publicado pela Vecchi em dois volumes: O Triângulo de Ouro e A Câmara da Morte - 1918), romance


        Divide-se em duas partes: "La Pluie d'Étincelles" ("A Chuva de Faíscas"), publicada em 1953 pela Vecchi como um volume independente intitulado O Triângulo de Ouro e "La Victoire d'Arsène Lupin" ("A Vitória de Arsène Lupin"), lançado igualmente como um volume independente sob o título A Câmara da Morte. O personagem principal de Maurice Leblanc só faz sua aparição na segunda parte como um Deus ex machina, salvando Patrício e Corália da morte e desvendando o mistério do triângulo de ouro.
        Cronologicamente, a ação se situa entre o aparente "suicídio" de Lupin (lançando-se do alto dos penhascos de Capri) e subsequente partida para a Legião Estrangeira, ao final do sombrio romance 813, e a sua reaparição pública em Os Dentes do Tigre.


        Primeira Parte: O Triângulo de Ouro - Um mutilado de guerra, o capitão Patrício (Patrice em francês) Belval, frustra uma tentativa de sequestro de uma enfermeira conhecida como Mamãe Corália (Maman Coralie). Apaixonado por ela, descobre que é casada. Seu marido, o banqueiro Essarès Bey, ligado a um complô para remeter ilegalmente ao exterior as reservas de ouro da França, aparentemente morre assassinado. Parte desse ouro, que a eclosão da Primeira Guerra Mundial impediu de ser expedido, jaz oculto na propriedade de Essarès, sem que ninguém o encontre. Além disso, um álbum de fotografias encontrado com Essarés, uma ametista quebrada e outros sinais entrelaçam os destinos de Patrício e Corália. Seus pais viúvos, que se amavam, morreram assassinados juntos, no mesmo dia. Durante todos esses acontecimentos, um inimigo oculto está sempre atacando. Ya-Bon, braço-direito de Patrício, sugere que chamem Lupin para desvendar o mistério. Mas ele não havia morrido ao saltar de um penhasco em Capri? Ao final Patrício e Corália caem na mesma armadilha que tirou a vida de seus pais.


        Segunda Parte: A Câmara da Morte - Arsène Lupin, enviado à França em missão secreta para recuperar os trezentos milhões em ouro e assim influenciar os rumos da Primeira Guerra Mundial, salva Patrício e Corália da armadilha mortal, põe-se no encalço do inimigo implacável, descobre o paradeiro do ouro (aplicando o princípio do conto A Carta Roubada de Poe), revela o verdadeiro destino do pai de Patrício e desmascara o perseguidor do casal, que se valerá de uma troca de identidades para agir com mais desenvoltura (a troca foi entre Essarès e seu secretário Simeão Diodokis).

        9. L'Île aux trente cercueils (publicado pela Vecchi em dois volumes: A Ilha dos Trinta Ataúdes e O Flagelo de Deus - 1919), romance



        Véronique casa-se com o cavalheiro polonês de má reputação Alexis Vorski, contra a vontade do pai. No ano seguinte, este rapta a criança nascida do casal, mas avô e neto morrem no naufrágio de um iate. Véronique recolhe-se a um convento carmelita e, mais tarde, torna-se uma humilde modista em Besançon. O polonês Alexis Vorski, acusado de espionagem durante a guerra, é detido, foge e morre assassinado na floresta de Fontainebleau, sendo lá enterrado. Uma profecia de família rezava que Vorski, filho de rei, morreria da mão de um amigo e sua esposa seria crucificada (e de fato Vorski é filho bastardo do rei Luís da Baviera com uma ocultista). Ao assistir a um filme, Verónique vê a cena de uma cabana abandonada onde aparecem, nas tábuas da velha porta, suas iniciais de solteira: V.d’H. Ela contrata a Agência Dutreillis para aclarar o enigma e esta a orienta a ir até a cabana, onde depara com um cadáver e uma folha de papel com um desenho de quatro mulheres crucificadas em quatro troncos de árvore, sendo uma delas a própria Véronique. Seguindo certas pistas, Véronique vai dar em uma praia. Lá encontra Honorine, que revela que seu pai e filho estão vivos na Ilha de Sarek, também conhecida como Ilha dos 30 Ataúdes


        Segundo uma velha profecia, no espaço de doze meses os trinta recifes principais que cercam a ilha, chamados de trinta ataúdes, terão suas trinta vítimas, mortas de morte violenta, entre elas quatro mulheres mortas na cruz. 1917 seria o ano fatídico. Véronique reencontra seu ex-marido Vorski, o "flagelo de Deus", que na verdade simulara sua morte, viera se refugiar na ilha e acabara se convencendo, com base numa antiga profecia de um monge beneditino do século XV, ser ele uma espécie de “ungido” destinado a resgatar a Pedra de Deus, que dá a vida e a morte, e se tornar todo-poderoso. Vorski revela seu amor por Véronique e promete que, se esta se submeter, reinará como uma imperatriz, elevando-se acima das outras mulheres. Do contrário, morrerá na cruz. Ela prefere a morte. A intervenção de um velho druida, ou melhor, Don Luis Perennna, ou ainda melhor, Arsene Lupin, salva Véronique da morte. Lupin (em seu estilo fanfarrão e justiceiro) faz Vorski de gato e sapato e revela toda a história da laje dos reis da Boêmia (um dos quatro fabulosos segredos de Cagliostro), que em tempos antigos veio parar na ilha, numa segunda fase foi associada a cultos druidas e acabou sendo ocultada pela Igreja, dando origem a lendas, superstições e profecias. Os poderes terapêuticos, e destruidores, da Pedra de Deus deviam-se à sua natureza radioativa.

        10. Les Dents du tigre (publicado pela Vecchi em dois volumes: Os Dentes do Tigre e O Segredo de Florence - 1920), romance



        A primeira parte narra o assassinato de Hyppolyte Fauvile e seu filho, parentes e herdeiros do milionário americano Cosmo Mornington; a atuação ambígua de Don Luis Perenna (anagrama de Arsene Lupin) ao provar a culpabilidade de sua viúva Marie-Anne Fauville (uma das provas são as marcas de seus dentes deixadas em uma maçã, os "dentes do tigre"), já que, como um dos beneficiários do testamento de Cosmo por ter-lhe salvado a vida enquanto legionário no Marrocos, Don Luis aparentemente teria interesse no desaparecimento dos demais herdeiros; a atuação sinistra de um misterioso primo de Cosmo, Gaston Sauverand, reconhecível pela bengala de ébano, que parece conspirar contra Perenna, infiltrando-se até em sua mansão e aliando-se à secretária Florence Levasseur; enfim, o convencimento de Perenna de que Marie-Anne, Florence e a viúva são inocentes. Neste caso, quem teria cometido o duplo crime e qual a origem das cartas misteriosas de Hyppolite que aparecem de dez em dez dias? A solução ficará para a segunda parte.



        Segunda parte: Apesar de provar a inocência de Marie-Anne e Gaston e mostrar que as provas contra eles foram plantadas pela própria vítima, Hyppolyte, num plano diabólico para se vingar do amor existente entre a esposa e Gaston, Don Luis não consegue evitar o suicídio de ambos, tornando-se assim o herdeiro universal de Cosmo, portanto suspeito aos olhos de uma facção da polícia parisiense e da opinião pública. Mas no dia marcado para a herança ser concedida, aparece outro parente de Cosmo, ninguém menos que Florence Levasseur. Mas longe de ter sido a autora dos assassinatos que a favoreceram, existe alguém por detrás que a manipula. E esse alguém a rapta. Quando Don Luis quer partir para salvá-la, sua identidade de Arsène Lupin é desmascarada e ele é preso pela polícia. Em troca da liberdade, oferece à França um reino no norte da África que conquistou em seu tempo de legionário e do qual se tornou imperador. Lupin vai atrás do bandido de avião, entrega-o ao chefe da polícia e se casa com Florence, indo morar na aldeia de Saint-Maclou, às margens do Rio Oise.

        11. Les Huit Coups de l'horloge (As Oito Pancadas do Relógio - 1923), coletânea de 8 contos




        A publicação das oito histórias dessa coletânea começa em 17 de dezembro de 1922 no jornal diário Excelsior, que despertou a curiosidade de seus leitores, nos oito dias precedentes, mostrando na primeira página a imagem de um relógio enigmático. O jornal anunciou em 16 de dezembro: “Sob o nome de Príncipe Rénine, reencontraremos, tão sutil, tão pitoresco, tão atraente como na origem de suas aventuras, o famoso ladrão de casaca (gentleman cambrioleur).” A coletânea foi lançada em livro em julho de 1923, com sucesso. O príncipe Sérgio (Serge) Rénine atrai Hortênsia (Hortese) Daniel, cuja vida é monótona, para 8 aventuras palpitantes de roubo, crime, mistério. Ele resolverá, para conquistá-la, os casos criminais com que depararem.

        NO ALTO DA TORRE
        Depois de impedir que Hortênsia (Hortense) Daniel fuja com um aventureiro, o Príncipe Renine (que tudo leva a crer tratar-se de Arsène Lupin) leva-a para visitar uma velha construção abandonada, o domínio de Halingre. Lá, ao entrarem num aposento, ouvem o tique-taque de um relógio que, após uns minutos, soa oito badaladas. Como poderia estar funcionando se não havia ninguém para dar corda? Na verdade, um óculo-de-alcance, atirado na caixa do relógio vinte anos antes, interrompeu a marcha do pêndulo. Quando Renine arrombou a porta do aposento, suas pancadas soltaram o pêndulo, e o relógio voltou a funcionar. Da torre do castelo, o óculo-de-alcance revela um crime cometido vinte anos atrás. Ao final do episódio, Renine convida Hortênsia a acompanhá-lo em uma série de aventuras.

        A GARRAFA D’ÁGUA
        “A melhor aventura é aquela que não se prevê. Surge de improviso [...]” Nesta aventura, Renine tenta salvar Tiago (Jacques) Aubrieux, condenado à guilhotina por ter supostamente assassinado um primo, Guilherme (Guillaume), para roubar 60 mil francos. Todos os indícios apontam para a culpabilidade de Tiago. O título refere-se a uma garrafa usada pelo assassino real para concentrar os raios do sol no dinheiro roubado, a prova do crime, fazendo-o pegar fogo.

        TERESA E GERMANA
        Um contato de Renine intercepta uma conversa telefônica em que se combinava lançar uma pessoa no final da tarde de 2 de outubro de um penedo em Etretat. Renine e Hortênsia partem para lá com a intenção de evitar o crime. Só que um crime realmente ocorre mais cedo. Seria o crime que pretendiam evitar?

        O FILME REVELADOR
        Renine e Hortênsia vão ver um filme, A princesa feliz, cuja atriz principal é a meia-irmã dela, Rosa Andreia (Rose-Andrée). Renine tem a impressão de que um dos atores, com jeito de brutamontes, olha de forma estranha para a “princesa”, como se sentisse por ela uma paixão não correspondida. Descobre que aquele homem chama-se Dalbrèque, “pessoa muito estranha, fechada, taciturna”. Algum tempo depois Dalbrèque arromba a garagem da produtora de filmes, rouba uma limusine, apodera-se de 25 mil francos e aparentemente sequestra Rosa Andreia.

        O CASO DE JOÃO LUÍS
        Renine salva uma moça (Genoveva Aymard) que tentou o suicídio atirando-se no Sena e descobre que ela foi abandonada pelo noivo. Ele e Hortênsia resolvem investigar o motivo e descobrem que, por uma conjunção de fatores e uma aparente distração da parteira, o jovem (Jean-Paul, João Paulo na tradução brasileira) era reivindicado por duas possíveis mães, que lhe infernizavam a vida.

        A DAMA DO MACHADO
        Uma série de mulheres são mortas a golpe certeiro de machado. Uma varredora de ruas encontra uma agenda com uma lista das mulheres assassinadas, cujos nomes eram acompanhados de um número. Um jornalista descobre que os números representavam o número de dias entre as mortes. O número junto do nome da última mulher assassinada aponta para 18 de outubro como a data do próximo desaparecimento de uma mulher. Pois exatamente nesta data Hortênsia desaparece. Renine se entrega a uma frenética e desesperada investigação para tentar localizá-la e salvá-la. Uma de suas descobertas é que todas as mulheres assassinadas tinham nomes com oito letras começando por H (Herminie, Hilairie, Herbette, Hortense etc.). Parece que os crimes são cometidos por uma louca.

        PASSOS SOBRE A NEVE
        Hortênsia recupera-se do susto na casa de uma parente no interior da França. De lá escreve uma carta a Renine relatando uma cena que presenciou numa taverna envolvendo o barão de Gorne, seu filho ciumento, Matias, a esposa Natália (Natalie) que “vive como uma prisioneira num pequeno solar” e um “belo cavalheiro”, Jerônimo (Jerôme) Vignal, “rondando em torno do solar”, despertando os ciúmes de Matias. Prevendo confusão, Renine dirige-se à aldeia. Lá chegando fica sabendo que três tiros foram ouvidos à noite no solar. Pelas investigações, aparentemente Matias foi atirado num poço sem fundo e todas as evidências (inclusive as marcas dos passos sobre a neve) apontam para Jerônimo como autor do crime, que tentou fugir com Natália. Hortênsia acredita em sua inocência e pede que Renine investigue o caso.

        “AO DEUS MERCÚRIO”

         Ao final da primeira aventura, Renine convidou Hortênsia a acompanhá-lo em sete outras e pediu que ela definisse as condições da última, que deveria se encerrar quando o relógio desse a oitava badalada, três meses depois. Hortênsia quis que ele descobrisse o paradeiro de um broche antigo, herdado da mãe, que lhe dava sorte e servia de amuleto, roubado anos antes. No episódio final Renine consegue recuperar o broche e conquista o coração de Hortênsia.

        12. La Comtesse de Cagliostro (A Condessa de Cagliostro - 1924), romance




        Ao visitar furtivamente sua namorada, Clarice (Clarisse em português) d’Étigues, o jovem Raoul d’Andrésy (Raul de Andrésy em português, na verdade Arsène Raoul Lupin quando usava ainda o sobrenome da mãe; a história transcorre em 1894, a primeira aventura de Lupin, mas só publicada após o “ajuste de contas definitivo” um quarto de século depois) espreita uma reunião em que o barão Godefroy (Godofredo) d´Étigues, pai de Clarisse, e seus cúmplices "julgam" e condenam uma “criatura infernal” e tentam matá-la amarrando-a em um barco e afundando-o. Essa criatura é Joséphine Pellegrini-Balsamo (Josefina Pellegrini Bálsamo), a Condessa de Cagliostro, supostamente nascida em 1788, portanto, centenária, que teria descoberto a fórmula da juventude (na verdade, conclui Raul, ela se vale da semelhança com a mãe para dar a impressão de que são a mesma pessoa). Raul a salva do afogamento. Tanto o bando do barão como o da condessa estão atrás de um fabuloso tesouro medieval escondido pelos monges. Joseph Balsamo (José Bálsamo), suposto "pai" (na verdade, avô) da condessa, “que agitou a corte de França sob o reinado de Luís XVI”, propôs-se a decifrar quatro grandes enigmas, mas não teve tempo para tal:

        In roboro fortuna (a fortuna no carvalho): decifrado por Doroteia em A rival de Arsène Lupin;
        A laje dos reis da Boêmia: decifrado por Lupin em A ilha dos trinta ataúdes;
        A fortuna dos reis de França: decifrado por Lupin em A agulha oca;
        O candelabro de sete braços: o tesouro dos monges medievais, tema deste livro.

        Desenvolve-se entre Lupin e a Cagliostro uma relação ambígua, de amor desenfreado, por um lado, e ódio e competição pelo tesouro, por outro. A Lupin repugnam os métodos violentos da condessa, que inclui tortura e assassinatos, daí a certa altura a abandonar. No penúltimo capítulo, defrontam-se num velho farol Beaumagnan, apaixonado pela condessa e líder do grupo a que pertence o barão, Clarisse, a condessa e Lupin. Este decifra o paradeiro do tesouro ao observar que as sete abadias que o acumularam formam a figura exata da Ursa Maior. O tesouro jaz na posição da estrela Alcor, iniciais de Ad lapidem currebat olim regina (para a pedra outrora corria a rainha), suposta chave do enigma. Num embate final, Lupin passa a perna na Cagliostro e embolsa o tesouro. Casa-se com Clarisse, que morre de parto seis anos depois. Seu filho, João, é raptado, aparentemente pela Cagliostro. 

        A cena da capa da edição da Vecchi, acima, não ocorre no livro, já que Raul salva a condessa amarrada no barco, não se afogando.

        13. La Demoiselle aux yeux verts (A Moça dos Olhos Verdes - 1927), romance



        Flanando pelos bulevares de Paris, Raoul de Limézy, um dos pseudônimos de Arsène Lupin quando tinha 34 anos, se deixa fascinar pela moça de olhos verdes, cor de jade, e a segue, numa relação em que se alternam amor e ódio, sempre a salvando, e sendo rejeitado, através de várias peripécias: o assassinato, numa viagem noturna num trem, da inglesa de olhos azuis (Constance Bakefield) junto com outros dois passageiros (os irmãos Arthur e Gaston Loubeaux), o roubo a uma mansão (villa Faradoni), a tentativa de extorsão contra o pai da inglesa (Lord Bakefield) no Bellevue-Palace de Monte Carlo, a atuação da moça de olhos verdes, sob o nome de Léonide Balli, numa opereta no teatro municipal de Toulouse representando o papel de “Véronique”, e seu refúgio (sob o nome de Aurélie) num convento nas montanhas. Enquanto a inglesa, embora de família tradicional, era ladra internacional, a moça dos olhos verdes age com um cúmplice, Guillaume, e tem que se defender de um criminoso rival, Jodot. Raoul precisa tirar de campo o comissário de serviço de pesquisas internacionais Rodolphe Marescal, que também está no encalço da moça. Que segredo oculta a moça de olhos verdes?

        Uma tarde no convento, num de seus encontros secretos com Raoul, Aurélie conta sua vida: seu pai morreu quando ela nasceu; quando ela tinha seis anos, seu avô materno revelou que detinha um segredo que no futuro a deixaria rica. Pouco depois a mãe casou de novo, com Brégeac. No ano seguinte, a mãe faleceu, mas deixou com a filha um papel com instruções que deveria seguir, quando completasse vinte anos, para se apossar do segredo legado pelo avô. Por segurança, ela memorizou o conteúdo e destruiu o papel. Mas com o passar dos anos esqueceu os detalhes. E agora todos a perseguem querendo extrair o segredo.

        Depois de enfrentar uma série de obstáculos, Lupin enfim descobre o tesouro legado pelo avô (ou, mais precisamente, pelo marquês de Talençay, amigo do avô de Aurélie): um antigo balneário romano, com uma “fonte da juventude” de águas radioativas, que havia sido ocultado sob as águas por ocasião da conquista da Gália pelos bárbaros, mas que um velho sistema de eclusas permite trazer à tona novamente. Só que Aurélie, desgostosa com tantas mortes e tragédias em torno daquele tesouro, abre mão dele e prefere iniciar uma carreira de cantora lírica. O lago de Juvains e a fonte da Juventude, novamente recobertos d'água, agora estão entre as várias “dessas maravilhas acumuladas e desses tesouros fabulosos que a França herdará de Arsène Lupin”.

        14. L'Homme à la peau de bique (1927), conto isolado


        Conto isolado publicado em 1927 numa coletânea intitulada L'amour selon les romanciers français (O amor segundo os romancistas franceses), inspirado em O assassino da Rua Morgue de Edgar Allan Poe, escritor pelo qual Leblanc costumava exprimir sua admiração. Um automóvel desgovernado atravessa a praça da aldeia de Saint-Nicolas num domingo de manhã, levando a bordo uma moribunda e um homem coberto de uma pele de cabra (peau de bique), deixando para trás um rastro de sangue e um mistério aparentemente insolúvel. Lupin se sente desafiado por um jornal parisiense que escreve que todos os Sherlock Holmes do mundo nada conseguiriam discernir, e o próprio Arsène Lupin entregaria os pontos.

        15. L'Agence Barnett et Cie (A Agência Barnett & Cia. - 1928), coletânea de 8 contos




        O ladrão de casaca desta vez assume a identidade de um detetive particular extravagante, Jim Barnett, que não hesita em roubar seus clientes ou os bandidos que ele persegue. Ele é ajudado em suas investigações pelo jovem inspetor Théodore Béchoux, um protegido do eterno adversário de Lupin, o inspetor positivista Ganimard. Béchoux logo duvida da honestidade de seu cúmplice, e chega a mandar prendê-lo após enfim desmascará-lo como Arsène Lupin. Maurice Leblanc define essas histórias como ocorrendo “um pouco antes da grande guerra” (Primeira Guerra Mundial).

        AS GOTAS QUE TOMBAM
        O barão Assermann, para se vingar da esposa que se casou por interesse e lhe era infiel, antes de morrer urde um plano para deixá-la na total miséria. Para isso, além de deserdá-la, planeja o desaparecimento de um valiosíssimo colar de pérolas de propriedade da condessa. Felizmente, o agente Jim Barnett, da Agência Barnett & Cia. de “informações gratuitas”, consegue surrupiar o testamento, salvando a condessa da miséria, ao mesmo tempo em que se apossa do colar.

        A CARTA DE AMOR DO REI JORGE
        Derrubando o álibi de um suspeito, Barnett elucida o assassinato misterioso do colecionador de livros antigos Vaucherel, que envolve uma carta antiga, guardada dentro de um livro, do rei Jorge IV à sua amante. Barnett consegue ficar com a carta, que vende depois para a interessada, Élizabeth Lovendale, descendente da amante.

        A PARTIDA DE BACARÁ
        Um homem (Paul Erstein) foi assassinado ao final de uma partida de bacará. Seus quatro companheiros de jogo estão acima de qualquer suspeita, que recai sobre o marido de uma mulher (Mme. Fougeraie) que ele cortejou, em cuja sacada foi encontrada a suposta arma do crime (um soco-inglês). Ela pede socorro a Barnett, que diz: “Segundo toda a lógica, o seu marido é culpado. No entanto, vou tentar desmentir a lógica.”

        O HOMEM DE DENTES DE OURO
        Objetos religiosos preciosos foram roubados da igrejinha de Vaneuil. Com sua lanterna elétrica, o abade conseguiu perceber na boca do ladrão, entreaberta por uma careta, dois dentes de ouro, do lado esquerdo. Um suspeito é preso, também com dois dentes de ouro, só que do lado direito!

        AS DOZE AFRICANAS DE BÉCHOUX
        Um maço de títulos valiosos, entre eles as doze ações das minas africanas de Béchoux, é roubado da mesinha de cabeceira do Sr. Gassire. Como ninguém saiu do prédio, supõe-se que os títulos estejam escondidos em algum lugar lá dentro, e monta-se um enorme esquema para revistar quem entra e quem sai, além de serem revistados todos os apartamentos. Enquanto isso, Barnett frequenta o prédio para ter lições de flauta com uma professora e ditar suas memórias para uma datilógrafa. Béchoux sabe que Barnett está tramando algo e teme que acabe se apoderando de suas “doze africanas”.

        O ACASO FAZ MILAGRES
        O jovem conde Jean d’Alescar é encontrado morto sobre um rochedo em frente do Torreão Velho do castelo de Mazurech. Seu pai havia hipotecado e depois perdido a propriedade para o pai de Georges Cazévon, rico industrial que agora a habita. O conde havia descoberto que seu pai, poucos dias antes de morrer, havia sacado do banco uma importância correspondente ao pagamento da hipoteca, mas não tivera tempo de quitar a dívida. Um desenho deixado por ele indica que o dinheiro teria sido escondido no Torreão, agora inacessível. Mas eis que um acaso o torna de novo acessível. “O acaso! Nada lhe é impossível. É a força mais perturbadora e mais engenhosa que existe; a mais imprevista e a mais caprichosa.” Na tentativa de acessá-lo, encontra a morte.

        LUVAS BRANCAS... POLAINAS BRANCAS
        Lupin elucida o desaparecimento misterioso de toda a cara mobília do apartamento da ex-esposa de Béchoux. E de quebra a seduz.

        BÉCHOUX PRENDE JIM BARNETT
        A esposa do financista Véraldy foi aparentemente sequestrada e depois lançada para fora do carro pelo deputado Jean Desroques, vindo a morrer. Mas o pai de Jean está convencido da inocência do filho. Uma fotografia desaparecida elucidará o crime. Na verdade Béchoux não chega a prender Barnett. Apenas lhe dá voz de prisão, mas o deixa escapar (propositadamente).

        16. La Demeure mystérieuse (A mansão misteriosa - 1928), romance



        Ao desfilar com uma túnica ornada de diamantes valiosíssimos emprestados pelo rico lapidário Van Heuben, a modelo Régine Aubry é raptada, levada para uma mansão, despojada da túnica e depois solta. Pouco depois sua colega Arlette Mazolle também é raptada, levada para aquela mesma casa, mas consegue fugir. As suspeitas recaem sobre o conde Adrien de Mélamare e sua irmã Gilberte, cuja mansão é reconhecida pelas modelos (mesmas escadas, mesmo piso, mesmos móveis...) Antoine Fagerault, amigo do casal de irmãos, ajuda a sustentar sua inocência e chega a noivar com Arlette, mas o Barão Jean d’Enneris (de quem se suspeita que seja Jim Barnett, ou melhor, Arsène Lupin), também apaixonado por Arlette, sente ciúmes e desconfia das boas intenções de Antoine. Ele irá investigar uma maldição que assola a família Mélamare desde que um antepassado, François de Mélamare, nos anos que antecederam a Revolução Francesa, construiu uma casa para abrigar uma amante. “Les plus beaux secrets, c’est comme l’oeuf de Christophe Colomb... il fault y penser” “Os mais belos segredos são como o ovo de Colombo... alguém precisa descobrir”) diz D’Enneris depois que desvenda “a razão misteriosa que dava tanta força aos inimigos do conde e sua irmã”. Li este livro (na tradução da Vecchi) deitado numa rede em Teresópolis nos idos de 1967 e agora, cinquenta anos depois (2017), releio no original francês e, conquanto não lembrasse mais as reviravoltas da trama, lembrava perfeitamente do “segredo” que explica todo o mistério da mansão! O qual não revelarei aqui.

        17. La Barre-y-va (O Mistério do Rio do Ouro - 1930), romance



        Lupin, sob o pseudônnimo de Raoul d'Avenac, encontra-se na Normandia para  desvendar os fatos estranhos ocorridos na propriedade de Barre-y-va (alusão à maré alta, “la barre, c’est-à-dire le flot, le mascaret” onde o rio Aurelle desemboca no Sena): assassinatos, ataques e a transplantação de três salgueiros interferindo na divisão da propriedade entre as irmãs Bertrande (viúva do Sr. Guercin, assassinado) e Catherine. O avô das irmãs, Michel Montessieux, homem estranho dado à alquimia, teria descoberto um meio de obter ouro em pó. Raoul, chamado por Catherine, que temia pela própria vida, descobre um antigo tesouro romano escondido num pombal que foi um antigo túmulo romano. Nos dias das grandes marés do rio Aurelle (que etimologicamente significa “rio do ouro”), o tesouro, infiltrado pelas águas, vai sendo, aos poucos, carregado e despejado no rio. Uma sequência de números no testamento do avô revela as datas do despejo do ouro. Dois empregados de confiança da propriedade (M. Arnold e Charlotte) procuram se apoderar desse ouro. Lupin se apaixona pelas duas irmãs, mas não consegue se decidir por uma delas, e acaba ficando sem nenhuma.

        18. Le Cabochon d'émeraude (1930), conto isolado


        Conto isolado, publicado em 15 de novembro de 1930 na revista Annales politiques et littéraires, aparentemente inspirado em "A Carta Roubada" de Edgar Allan Poe, com tinturas psicanalíticas e alusão ao funcionamento do inconsciente ("...ces phénomènes psychiques [...] qui provoquent en nous [...] des actes qui échappent au contrôle de notre conscience"). Uma joia de esmeralda valiosa desaparece numa sala onde só se encontram duas pessoas: a princesa Olga e seu pretendente Maxime Dervinot. Sob o nome de barão d'Enneris, auxiliar de Jim Barnett, Lupin decifra o mistério que, como no conto de Poe, parece inexplicável mas é de extrema simplicidade.

        19. La Femme aux deux sourires (A Mulher de Dois Sorrisos - 1932), romance



        A cantora lírica Élisabeth Hornain, sobrenome de solteira Valthex, aparentemente é assassinada numa recepção no castelo de Volnic quando ia cantar ao ar livre sobre um outeiro, e suas joias aparentemente são roubadas. Seu amante, o Marquês d’Erlemont, depois do fatídico episódio adquire a propriedade, mas vai lá raramente. O sobrinho da morta, um bandido procurado pela polícia conhecido como "o grande Paul", possui um dossiê “provando” que quem cometeu o assassinato foi o marquês, para se apoderar das joias e assim recuperar-se financeiramente, já que a fortuna da família havia se perdido. O policial Gorgeret tem como ideia fixa solucionar o crime. Raoul, uma das falsas identidades de Arsène Lupin, também quer solucioná-lo e ajudar o marquês a recuperar a fortuna perdida (e embolsar sua "comissão", entenda-se). Assim ele se envolve com Antonine, filha natural do marquês com a cantora, que aparentemente tem dupla personalidade, pois parece ser também Clara, a Loura (Clara la Blonde), ex-amante do grande Paul e dançarina de cabaré. Daí o título “a mulher de dois sorrisos”, um sorriso encabulado e outro malicioso. Lupin desvenda o mistério dessa “dupla personalidade” e demonstra que na verdade Élisabeth não foi assassinada nem roubada. Minhas revelações param por aqui. Para saber a causa da morte da cantora você terá que ler o livro. E não se arrependerá disso.

        20. Victor, de la Brigade mondaine (Arsène Lupin, na Pele da Polícia - 1934), romance



        Já que o título do livro em português contém um spoiler, vou abrir o jogo. Se você ainda não leu o livro, pare por aqui, e só retorne após a leitura...

        O "ladrão de casaca" Arsène Lupin infiltra-se na polícia para combater um impostor que se faz passar por ele, um tal de Antoine Bressacq. Para isso assume a identidade de um peruano, Marcos Avisto, e conquista a confiança da bela jovem de cabelos castanhos e olhos claros que viu pela primeira vez no Cinema-Balthazar e que supostamente está apaixonada pelo impostor. Um incidente ocorrido nesse cinema o leva a averiguar e solucionar o sumiço dos 900 mil francos em Bons de la Défense, os Bônus da Defesa Nacional, roubados de um banco de Estrasburgo. A disputa por esses bônus provoca uma série de incidentes e assassinatos. No final, Lupin consegue embolsar parte da fortuna de um velho ricaço grego chamado Sériphos aplicada num álbum de selos postais raros (o dossiê A.L.B.), de que o impostor pretendia se apossar. Final feliz: o verdadeiro Lupin enfim conquista a jovem do cinema.

        21. La Cagliostro se venge (A Vingança da Cagliostro - 1935), romance



        Numa bela manhã de janeiro, Raoul de Limésy, um dos codinomes adotados por Arsène Lupin, adentra o Banque des Provinces para depositar um cheque e desce ao subsolo para pegar documentos no seu cofre-forte. Lá observa que um cliente, Philippe Gaverel, está sacando maços de notas de mil francos. Segue o cavalheiro primeiro pela rua, depois no trem, até a estação de Vésinet, onde vai até uma casa chamada les Clématites. Raoul, ou melhor, Lupin, adquire uma propriedade naquela mesma localidade com a má intenção de pagá-la com o dinheiro que pretende surrupiar de Philippe. Acontece que uma das duas sobrinhas de Philippe que moram em les Clématites, Elisabeth, noiva de Jérôme Helmas (a outra sobrinha é Rolande), quando sai para dar sua volta vespertina habitual, é atacada e morta sem que se consiga descobrir a motivação do crime, e Lupin logo percebe que ali dois dramas independentes, o segundo narrado na primeira parte do livro, e o primeiro, na segunda, se entrecruzam. 

        O segundo drama envolve o filho que Lupin teve com Claire d’Étigues, raptado por Joséphine Balsamo, condessa de Cagliostro, “criatura implacável e bárbara”, que ela depois mandou criar com ordens de que fosse transformado “num ladrão, num criminoso se possível” para mais tarde “se opor ao pai” (seu nome: Félicien). Já o primeiro drama envolve a disputa por uma herança que será deixada para uma das duas sobrinhas de Philippe. Como sempre, Lupin passa para trás a polícia. Enquanto esta corre atrás de provas, Lupin defende a tese digna de um Sherlock Holmes de que “les preuves sont quelquefois moins probantes que la logique”, “as provas são às vezes menos comprovatórias do que a lógica”. Como em toda história de Lupin, existe também uma mulher fatal por quem se apaixona, Faustine, que serviu de modelo a uma estátua de Frineia. Claro que não revelarei aqui o final surpreendente, para não estragar sua leitura do livro.

        22. Les Milliards d'Arsène Lupin (1939), romance póstumo com a colaboração de sua filha Marie-Louise



        Depois que Lupin se desfaz de suas propriedades, convertendo-as em ouro depositado no cofre-forte de um banco, uma organização criminosa de caráter mafioso planeja surrupiar sua fortuna. Mas Lupin consegue se infiltrar nessa máfia, frustrando o roubo. No processo, envolve-se com a bela secretária americana Patricia Johnston, que trabalhava no jornal de notícias policiais de um dos membros da organização. Contrariando seu hábito, Leblanc não pôde revisar a obra entre sua publicação em folhetim e a edição póstuma em livro, o que fez com que contivesse algumas falhas, como a omissão do folhetim 23 de 3/2/1939, dificultando a compreensão da trama. 

        23. Le Dernier Amour d'Arsène Lupin (2012), romance póstumo datilografado, permaneceu em estado de rascunho, editado em 2012 pela Balland


        Sob o nome de Capitão Cocorico, Lupin leciona para crianças pobres de Jullainville, na periferia norte de Paris, enquanto sob o nome de André de Savery trabalha como arqueólogo no Ministério do Interior. Apaixona-se por Cora de Lerne e a desposa.

        PS. Quem lê francês pode também consultar um resumo das obras de Leblanc sobre Lupin, incluindo peças de teatro, clicando aqui

        PS2. VEJA MEUS VÍDEOS SOBRE LITERATURA FRANCESA:

        5 comentários:

        Ricardo W disse...

        Sensacional

        Unknown disse...

        Excelente !

        Anônimo disse...

        Piramidal!

        Anônimo disse...

        O seriado da Net (Lupin) me levou até o grande Maurice.

        Eduardo Alencar de Azambuja disse...

        Eu devia ter uns 16 anos quando me deparei simultaneamente com a obra destes dois gigantes, Arthur Conan Doyle e Maurice Leblanc, o que me tornou um ledor onívoro. Ainda tenho alguns livros comigo dos dois escritores, são edições antigas de 1960. A série da Netflix me levou de volta no tempo e aguçou minha vontade de ler de novo, embora a consistência literária não seja compreensível para o leitor de nossos dias. Lendo os resumos biográficos postados na Wikipédia encontrei o endereço deste Blog SOPA NO MEL. São livros fantásticos, impregnados de informações que a cultura brasileira nem consegue assumir.