O mais bonito dos surrealistas, nos anos 20, era que eles não queriam apenas mudar a arte, mas a vida. Salvador Dali, Buñuel, Breton, Man Ray, Duchamp, a linguagem dos sonhos e dos pesadelos, imagens do inconsciente — novas visões de corpo e alma. Mudou a arte, sem dúvida, mas o ser humano...
Da mesma forma, mas sem a mesma graça, a ambição dos comunistas cubanos nos anos 60 era não só o igualitarismo e a sociedade sem classes, mas a criação do "novo homem cubano", e a nova mulher, por supuesto. Ético, patriota, disciplinado, consciente, politizado, justo, solidário, boa saúde, bons dentes, estudado, este novo ser surgiria como o fruto final da Revolução. Como diria Copélia, não a famosa sorveteria cubana mas a de "toma lá dá cá", prefiro não comentar.
No desmantelamento da União Soviética, a Rússia e outras repúblicas socialistas que aderiram ao capitalismo se tornaram, porque já eram antes, alguns dos países mais corruptos do mercado livre. Claro, eram os antigos "novos homens", formados na burocracia estatal corrupta e infiltrados em toda a sociedade, criando uma cleptocracia.
Os sonhos do Fórum Social Mundial são mais modestos, apenas a transformação do mundo. O problema é que são muitas as aproximações, e contradições, entre um novo mundo que eles creem possível e um mundo velho que já se provou impossível e desmoronou com o Muro de Berlim.
Outro problema comum a surrealistas, comunistas e foristas é a confusão entre ideais, sonhos e delírios, que sempre acabam custando caro para os que eles querem "libertar".
Do tempo dos surrealistas e da revolução cubana o mundo melhorou muito, pela ação de homens e mulheres de boa vontade, mas o ser humano, não sei não... Está para nascer sistema político ou econômico capaz de criar, além de um mundo novo, um novo homem.
Ou talvez o "novo homem" dos velhos comunas só exista mesmo na Suécia, na Noruega, na Dinamarca, que investiram fundo na social democracia, criaram prosperidade e distribuíram riqueza e educação, criando condições para uma forma mais civilizada de viver. Embora chatíssima, para padrões latino-americanos.
Crônica publicada originalmente no jornal O Globo de 30/1/09. Foto: obra do pintor surrealista russo Evghenie Gordiets obtida de um PPS que circulou na Internet.
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