Íngreme, estreita, escura e curva é a escada que sobe para
minha mansarda.
Capaz de desanimar os velhos fôlegos cardíacos, nunca,
entretanto, intimidou meu já muito vivido coração. Pelo contrário: leva-me
leve, alado como os anjos da escada de Jacó.
Jamais me arrependi de tê-la subido. Sempre me arrependi de
tê-la descido. Porque é mesmo uma ascensão ir pelos seus degraus acima: um
desprendimento do rasteiro, numa ânsia de quietude, isolamento e sonho, para o
pleno ingresso nos meus Paraísos Interiores. E porque é sempre uma degringolada
ir pelos degraus abaixo: uma humilhante devolução ao mundo de todo o mundo, uma
expulsão de réprobo atirado impiedosamente às ganas da caterva.
Escada de minha mansarda...
Chego, pesado, do dia cretino e pornográfico, esbanjado
entre interesses desinteressantes, palavrórios e palavrões, mandos e desmandos,
incompreensíveis incompreensões...
Chego. O fardo é exaustivo. Enfrento a escada. Parado, um
instante, deixo ir por ela o olhar e o pensamento. Já isso é um alívio. O
mundo, que eu piso, assume, então, certa importância: a de um capacho. Na sua
áspera fibra limpo a sola dos meus sapatos. Lá, no topo, está a libertação.
E subo, contando os degraus, que vão ficando cada vez mais
fáceis. E eu vou ficando cada vez mais leve.
Mais fáceis... Mais leve... Mais...
Pronto!
Aqui não há leis: nem mesmo a da gravitação terrestre.
Aqui é um ponto fixo no espaço. Talvez aquele por que
suspirava Arquimedes: — “Dê-me um ponto fixo no espaço que, com uma alavanca,
eu moverei a terra!”
Eu tenho esse ponto. E basta. Não quero alavanca. Porque a
terra não me interessa.
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