CENTENÁRIO DE ADONIAS FILHO, por CYRO DE MATTOS


Comemora-se neste ano o Centenário de Adonias Filho, escritor baiano aclamado pela crítica nacional, nascido em Itajuípe, antigo Pirangi, distrito de Ilhéus, em 27 de novembro de 1915. Deixou em sua obra de contista e romancista cinco livros que têm como cenário o Sul da Bahia na época da conquista da terra: Os Servos da morte (1946), Memórias de Lázaro (1952), Corpo vivo (1962), Léguas da promissão (1968), e As velhas (1975).

Adonias Filho é um autor de livros de ficção que engrandece a região cacaueira baiana no corpo das letras brasileiras. Legítimo homem da civilização cacaueira baiana sustentou pela vida afora um amor de perdição por suas raízes e histórias de sua gente. Nos últimos anos de vida, mudou-se do Rio de Janeiro e foi morar com a esposa na sua fazenda Aliança, em Inema. Depois de muito caminhar pela cidade grande, por entre edifícios e gente vinda de todos os lados, retornava aquele homem de voz mansa, cordial, ao chão de seus ancestrais.


É sabido que a obra literária motivada por certa região enfoca o peculiar de determinada cultura, tendo por fundo um cenário típico, cujas condições são refletidas no conteúdo da narrativa, conferindo-lhe nota especial. Os estudiosos dizem que o que faz uma obra regional é o fato de mostrar-se presa, em sua matéria narrativa, a um contexto cultural específico, que se propõe a retratar e de onde vai haurir a sua substância. Mas isso não a impede de adquirir sentido universal, em função de seu significado portador de humanidades, mensagem profunda da existência, fazendo com que ultrapasse as fronteiras da região retratada.

É o caso do consagrado narrador Adonias Filho. Um criador de histórias que tem como cenário a região cacaueira baiana na época da infância quando a selva era impenetrável e hostil. Percebe-se nesse artesão da linguagem uma moderna forma de ser contada a história, harmonizada com a representação das essencialidades da criatura, as quais são retiradas do ambiente onde habitam.

Ressalte-se que atrás do homem de determinada região, com sua típica problemática existencial do indivíduo, seus falares e maneiras próprias de relacionar-se com o mundo, há o que é próprio de qualquer ser humano onde quer que esteja. Razão e emoção, pensamento e sentimento. O pensamento e o sentimento dos personagens de Adonias Filho obedecem às forças cegas do destino, que resultam de solidões e desesperos impostos pelo ambiente de natureza bárbara. Como seres embrutecidos, primitivos, possuem os sentimentos reprimidos. São índios, negros, tropeiros, caçadores, pequenos agricultores arruinados.

Esse narrador de estilo sincopado e poético é uma das vozes fundamentais da melhor literatura de todos os tempos. Influenciado pelos dramaturgos gregos, Shakespeare, o cinema, do fundo trágico de seus romances, novelas e contos emanam personagens marcantes, em cujos passos e travessias ressoam os sortilégios da morte através de entonações bíblicas.

Homem culto, simples, ocupou cargos públicos importantes. Foi diretor da Biblioteca Nacional, Editora A Noite, Serviço Nacional de Teatro e pertenceu à Academia Brasileira de Letras. Conquistou o Prêmio Nacional da Fundação Educacional do Paraná, Instituto Nacional do Livro, Jabuti, Pen Club do Brasil e Fundação Cultural do Distrito Federal pelo conjunto da obra. Seus romances foram publicados nos Estados Unidos, Portugal, Alemanha, Venezuela e Bratislava. É tão importante o seu trajeto de vida para o Sul da Bahia que foi instalado em Itajuípe o Memorial Adonias Filho para preservar sua obra e acervo. O Centro Cultural de Itabuna, da Fundação Cultural da Bahia, leva o seu nome. Ele é o patrono da Academia de Letras de Itabuna (ALITA).

Depois que a esposa Rosita morreu em 1990, Adonias Filho caiu em grande tristeza. Ficava deprimido, em seus vagares pela casa-sede da fazenda. Dizem os conterrâneos que morreu de amor, em 2 de agosto daquele mesmo ano, na casa-sede de sua fazenda, em Inema. O homem criador de romances pujantes e densos não conseguiu suportar a solidão com a perda da mulher amada e companheira

Agora, no reencontro do legítimo homem do cacau com a sua paisagem, no seu regresso às origens, o bem vence o mal. Ultrapassa a morte pelas mãos do amor vivido entre Adonias e Rosita.

Cyro de Mattos é contista, romancista, poeta e cronista. Tem livros pessoais publicados em Portugal, França, Itália e Alemanha. Organizou e prefaciou a coletânea Histórias Dispersas de Adonias Filho. 

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